2014.12.20
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Menino Jesus,
é a primeira vez que te escrevo, pelo Natal. Há muito tempo que ouço falar de ti. Sabes bem o que te digo! Quando eu era pequenita, há muito tempo já, ensinaram-me no infantário a escrever a um gordo de barbas brancas vestido de vermelho, (se ainda fosse de azul escuro!) chamavam-lhe o Pai Natal, garantiram-me que ele descia pela chaminé na noite de 24 e ia trazer-me um presente se me tivesse portado bem durante todo o ano. Ficava triste ao olhar para os traquinas da minha sala do jardim infantil ao pensar que nada iam receber. Em casa o cenário era outro, bem diferente, eras tu que descerias não sei por onde, pois não tinha chaminé nem lareira…. Meu pai convidava a que eu colocasse aos pês da árvore de natal uma soquinha de madeira que ainda hoje a guardo, tinha que ficar junto do presépio onde tu não estavas, pois ainda não tinhas chegado com os presentes. Só chegarias na noite do dia 24. Tudo mudou. E muita da fantasia perdi. Este ano, relembrando o tempo em que toda a ternura me aconchegava na noite fria de inverno, resolvi porque os tempos que atravesso são difíceis escrever-te. Senti necessidade de fazer-te alguns pedidos. Menino Jesus da minha pequena infância, traz-me coragem para suportar a maldade, dá-me resistência para aguentar a solidão e a tristeza na minha família e no mundo. Presenteia-me com energia para continuar a enraivecer-me face às agressões sociais, e à dor das crianças que envelhecem antes do tempo, dos idosos que morrem sem um sorriso de quem amam. Ajuda-me a aceitar, a resistir as falsas verdades, a perdoar o imperdoável, a integrar o que disperso se encontra em mim. Depois, no dia 24, enquanto as famílias se unem, riem e convivem fica sentadinho no céu a vigiar os meus, a vigiar-me a mim. Faremos companhia um ao outro. Pois não tenho mais ninguém. Se achares que estou a ser demasiado pedinchona, não tragas nada. Dá-me só o teu grande amor, fica junto a mim no cantinho de alguns minutos da minha infância, onde reinou a fantasia, o sonho e a terna ilusão de o ser! Obrigada, Menino Jesus.  Este Natal vem cear comigo. Estás convidado. 
2014.12.14
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São João da Cruz [1542-1591]
Homem de pequena estatura, mas com um coração simplesmente imenso. Cantou a natureza, a fé, a eternidade e também o sofrimento sempre que permitiram a união com Deus. Ágil como pássaro solitário o seu voo foi sempre para Deus, num voo de peregrino convicto, de sábio humilde, de amigo do silêncio, que viveu desposando apaixonadamente a Cruz de Cristo na sua vida!
Quanto mais o lemos, mais descobrimos neste homem pequenino um contemplativo de olhar sereno enamorado por Deus, como se já em vida saboreasse a glória dos eleitos.Que amável caminho nos propõe este místico! Um caminho interior no qual a alma se despoja de tudo, para se encontrar no infinito oceano de Deus. Um caminho em que nos vamos calando diante do grande mistério de Deus, tocados e abraçados pela Presença que nos devolve confiança e serenidade.
A vida de São João da Cruz é cristalina e luminosa, e por isso o seu conhecimento estimula o ritmo da nossa. A força que dela emana anima-nos a amar o Amor, ainda que tenhamos de confrontar-nos com as sombras, o medo, a noite, as renúncias e as subidas íngremes.A Chama de Amor guiou-o e inspirou-o, pelo que a sua doutrina permanece viva e actual! O seu mundo espiritual povoa e cativa quem se deixa enamorar por Deus, guiado pela sua mão de mestre. Pela sua mão vai-se para o centro, porque o Amor gosta de viver no centro do centro. Aí vive Deus Amor que habitou o Santo e quer fazer morada em nós.Conhecer São João da Cruz obriga a enraizarmo-nos nas suas palavras sempre belas e cheias de Deus, como estas: «Fomos criados para o amor»! É nesta máxima que muitas vezes me quero centrar, porque reconheço nela uma mola impulsionadora de vida, um caminho de luz que silencia corações caminhantes…
A luz que brota desta frase desinstala e conforta em profunda e harmoniosa unidade com o mundo e com Deus. Leva ao enamoramento de Deus, tal como se enamorou de nós. E obriga a aperfeiçoar e a limar a alma, tal como ele nos aconselha; e obriga a lavar todas as sujidades que encontrarmos no nosso caminho interior, para que o amor que amamos seja o amor de Deus em nós.
Deixar-se guiar pelo mestre é um permanecer sólido e vibrante no encontro com os seus ensinamentos, é cavar o nosso interior em silêncios de inacabada procura. Tal busca só é possível se confiadamente deitarmos pés ao caminho, porque a subida é difícil. Porém, lermo-nos em São João da Cruz é fazer caminho com ele e só terminar na casa do olhar de Deus.Celebrar a memória de São João da Cruz é a possibilidade de apreender a procurar o caminho certo e estreito, pelo qual a alma se acerca mais directamente a Deus. A sua experiência e o seu caminho espiritual são dicionário fecundo para o nosso encontro com Deus pelo qual Ele se revela. É convite ao abandono a deixarmos que o Amor nos leve às alturas da contemplação, a buscar o encontro com o Amado. Quem melhor que ele fala da união com Deus? Uma união que tem de ser dolorosamente buscada na fé e na esperança? Mas no fim vence quem ama! É esta vitória que devemos querer nas nossas vidas!
A vitória de São João da Cruz recorda-nos que a bagagem que trazemos, se não for divina deve ser rejeitada, num despojamento libertador de todas as dependências. Os estorvos devem ser rejeitados para que Deus possa preencher a nossa vida com a Sua presença feita de pequenos detalhes e de pequenos nadas que nem sempre sabemos ver. Não procures mais, perde-te n´Ele, que Ele está em ti! Faz como São João da Cruz, oferece‑Lhe os sofrimentos e os teus nadas, e não te vanglories… Na pequenez da vida está a plenitude de Deus.Neste homem o coração ardeu em fogo de amor, porque não arderia o teu? Hoje flamejam os seus deliciosos ensinamentos, que continuam a seduzir-nos porque são de Deus e nos atraem para o convívio do amor.
Vai. Segue o caminho iniciado no Baptismo: Despoja-te de tudo para que Deus se agrade de ti, tal como se agradou e sentiu bem na vida de São João da Cruz! Ó que belo projecto!